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Publicado em O Jornal da Tarde,03/07/1996

Tecnologia e desemprego

Os 7 países mais ricos (G-7) se reuniram novamente em Lyon. Deu bate-boca entre Bill Clinton e Jacques Chirac. Assunto: desemprego.

Nos últimos 20 anos, a Europa não conseguiu criar um único emprego à sua gente enquanto que os Estados Unidos geraram 38 milhões. Apesar disso, o Presidente da França disse que os americanos criaram empregos de má qualidade - baixos salários e curta duração.

Bill Clinton, por sua vez, tinha em mãos resultados de duas importantes pesquisas. A primeira, mostra que mais de dois terços dos novos empregos criados no seu país têm salários superiores à média sendo que a maioria é em tempo integral (Department of Labor, Job Creation and Employment Opportunities: The United States Labor Market, Washington: 1996).

A outra foi feita pela Universidade de Michigan e prevê que só setor automobilístico criará cerca de 170 mil novos postos de trabalho até o ano 2003 no nível de US$ 46 mil por ano, chegando até US$ 70 mil com horas extras (Robyn Meredith, "New Blood for the Big Three's Plants", The New York Times, 21-04-96).

Muitos se apressam em dizer que a tecnologia só destrói empregos. Isso não é verdade. Há países que usam intensamente as tecnologias modernas e, no entanto, apresentam taxas de desemprego muito baixas como os Estados Unidos (5,5%); o Japão, (3,2%); e os Tigres Asiáticos (2% em média). Por outro lado, países da Europa que fazem a mesma coisa, têm taxas escandalosas como a Alemanha (10%); a Fran-ça (12%); a Itália (13%); a Bélgica (14%); e Espanha (23%).

Essas discrepâncias sugerem que, para conviver pacificamente com os seres humanos, as novas tecnologias exigem mudanças institucionais importantes - especialmente na legislação trabalhista e na educação. Quando a contrata-ção e a dispensa são flexíveis - como nos Estados Unidos, Japão de Tigres - os estragos são bem menores. Quando se dá o inverso, como na Europa, o desastre é conhecido.

O mercado de trabalho está passando por mudanças colossais. Há ocupações que morrem enquanto outras nascem. Algumas definham e muitas se fortalecem. A grande maioria passa por uma metamorfose radical, exigindo novas habilida-des. As pessoas que usam computador têm mais emprego e ganham 15% a mais do que os que não o fazem (Alan Krueger, citado por G. Pascal Zachary, "High Technology Explains Widening Wage Gaps", in Wall Street Journal, 22-04-96).

Adaptadas ao Brasil, as críticas de Jacques Chirac caem como uma luva. A "precarização do emprego" atinge quase 50% da nossa força de trabalho. Sim, porque além de inves-tirmos pouco no setor produtivo, o Brasil tem uma legislação trabalhista esclerosada e nossos trabalhadores têm apenas 3,5 anos de escola, em média.

A qualidade da nossa força de trabalho é 14% menor do que a média da América Latina, 39% inferior a da Argentina e 45% mais baixa do que a média dos países desenvolvidos (IPEA/PNUD, Relatório sobre o Desenvolvimento Humano no Brasil, Brasília: 1996). Esse relatório conclui que "o principal determinante do menor nível de renda per capita do Brasil em relação aos países desenvolvidos é a menor qualidade relativa da força de trabalho brasileira" (pág. 27).

O Presidente Fernando Henrique Cardoso não gosta dos catastrofistas. Nem eu. Mas, é preciso olhar atentamente para essa realidade a fim de se encaminhar medidas concretas para gerar mais postos de trabalho para o nosso povo.

A tecnologia e a globalização são inevitáveis. Nesse quadro, a educação é essencial para trabalhar - e o que vem sendo feito nesse campo é tão louvável quanto insuficiente. A flexibilização da legislação trabalhista é estratégica - e o que se fez até o momento foi nada.

Temos de agir com mais afinco e mais velocidade. A deterioração do quadro do trabalho é o estopim para a dete-rioração de toda a sociedade. Os sinais já são evidentes na marginalidade, corrupção e desencanto pelo país.

Num quadro como esse, as reformas constitucionais também se tornaram insuficientes. Elas devem ser feitas, mas chegou a hora de mobilizar a população para que os incluídos passem a ajudar mais diretamente essa enorme legião de excluídos. é hora de fazer tudo o que se pode para salvar as próximas gerações.